segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Política Externa para África e Internacionalização de Empresas no Governo Lula: uma estratégia de inserção

Com a chegada à Presidência da República de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003, é anunciada como uma das principais metas do governo a cooperação e criação de coalizões de nível Sul-Sul, aprofundando e, de certa forma, reconstruindo aquilo que já havia sido iniciado aos finais do governo Fernando Henrique Cardoso. É reforçada como ponto de sustentação a revalorização do protagonismo internacional brasileiro, com clara intenção de ressuscitar a questão do desenvolvimento e ainda discussões e debates sobre os impactos da clivagem Norte/Sul nas relações internacionais.

Já o continente africano tem observado durante toda a década de noventa e início do século XXI, avanço no processo gradual de democratização dos regimes políticos e a contenção dos conflitos armados. Isto representa um aspecto qualitativo e quantitativo nos resultados econômicos e oportunidades a serem auferidas no mercado externo. Constata-se também o aumento do comércio internacional e dos investimentos externos direto, associados as reformas macroeconômicas da década passada, sustentada na responsabilidade fiscal, além de uma maior preocupação social, atualmente. Esses resultados puderam ser alcançados, também, pela elevação da confiança das elites por meio de novas formas de renascimentos culturais e políticos.

Tentando estar atento às mudanças que sucedem no cenário internacional e na África, o governo busca, desde o primeiro ano do governo Lula, iniciativas de desenvolvimento econômico nacional, passando por ações políticas coordenadas e investimentos produtivos. Isto combinada com uma ação internacional condizente, acabaria por assegurar uma maior autonomia ao país no cenário internacional. Pode ser analisado pela Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), do governo federal, a qual estabelece cinco grandes estratégias para elencar o desenvolvimento nacional, sendo uma destas a manutenção e posicionamento de “empresas brasileiras entre os cinco principais players mundiais em sua atividade, considerando que a liderança pode se expressar nas dimensões patrimonial, tecnológica e/ou produtiva. Mineração e siderurgia, assim como a indústria aeronáutica e o complexo produtivo do bioetanol, são sistemas produtivos que tipificam essa estratégia”.

Como relatado logo acima, faz-se necessário somar setor energético petroquímico de forte presença nacional e internacionalmente. Em medida, os três grandes setores produtivos do país – mineral, petroquímico e da construção civil – alojam, respectivamente, as três maiores empresas multinacionais com presença física – firmas ou mesmo filiais – em outros continentes. São elas: Petrobras, Vale e Odebrecht. Sendo as companhias chaves na expansão e fortalecimento da presença brasileira no exterior e principalmente no continente africano.

Esse período analisado é caracterizado por Vigevani (2007), como uma tentativa de alcançar autonomia pela diversificação, onde o governo se proporia a expandir e diversificar suas parcerias e estratégias em atuação no cenário internacional. Diferente em certos aspectos da autonomia pela participação, elencado no governo Cardoso. Procura, portanto, aprofundar as relações Sul-Sul e denunciar o conflito ainda existente entre Norte-Sul, mas defendendo ao mesmo tempo ampla participação em fóruns multilaterais.

Essa nova visão de mundo estaria baseada na percepção de que o ordenamento global passou por sensíveis modificações, necessitando, de uma nova atitude do Brasil nesse novo contexto, entendendo que o continente africano não pode mais ser renegado na relações internacionais. Nesse sentido, o presidente Lula desenvolve uma intensa atividade de aproximação, promovendo: visitas aos países acompanhado de empresários brasileiros, perdões de dívidas externas, abertura de representações diplomáticas em novos territórios – antes tidos como irrelevantes para o país – a expansão de acordos comerciais – impactando significantemente no crescimento do comércio exterior brasileiro –, além do aporte financeiro no processo de internacionalização das empresas nacionais.

Entre os principais objetivos elencados pelo Brasil, encontra-se a perspectiva de aumento nas relações comerciais com a África, apoiados também em atos de política externa – esta teria como função a promoção de acordos e tratados bilaterais. Estas ações influenciam perceptivelmente, o crescente comércio exterior entre as partes contratantes, além da expansão das empresas nacionais, alargando a presença brasileira em solo africano. Esse processo de internacionalização se torna condição necessária para o país, como medida de fortalecimento de suas capacidades competitivas diante da concorrência crescente em seu mercado doméstico.

Pode-se perceber, desde 2003, a partir de uma política econômica e externa mais arrojada, uma retomada na recuperação dos investimentos diretos brasileiros no exterior, alcançando taxas de crescimento de 14% ao ano, patamares superiores aos das economias asiáticas – China, Coréia do Sul, Taiwan. Esse fato encontra explicações em diversos pontos, entretanto, pode-se discriminar a expressiva melhoria financeira das empresas brasileiras, assim como a recente valorização cambial, da perspectiva da política governamental de incentivo a internacionalização das empresas e o apoio expressivo do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) em forma de empréstimos a baixo custo.

Cabe observar que, até recentemente, os casos bem-sucedidos advindo dos processos de internacionalização das empresas brasileiras, decorreram, quase exclusivamente, da iniciativa das próprias corporações, não sendo baseada numa política deliberada de apoio governamental à criação de multinacionais brasileiras, mudando essa situação a partir de 2002. Utiliza-se, portanto, de elementos de políticas públicas para fomento dessa meta-base, como incentivos fiscais, financiamentos, mecanismos de seguros para os investimentos e liberalização das restrições aos investimentos diretos no exterior.

Percebendo a oportunidade de vincular de forma mais contundente as economias brasileira e africana e de obter resultados econômicos expressivos, além de outros benefícios difusos dessa relação estratégica com o continente africano, o aumento da presença brasileira na África, orientanda por uma política externa condizente que ajuda a reatar e aprofundar laços econômicos e culturais com os países africanos.

A África é vista hoje como uma grande oportunidade, pois, apesar de diversos países estarem num elevado crescimento econômico – visto entre 2007 e 2008, países como Angola (16,7% e 13,2%), Moçambique (7% e 6,5%), e Cabo Verde (6,9% e 5,5%) –, ainda há uma grande capacidade ociosa de produção nestes. O governo Lula, toma como uma chance para a expansão dos investimentos brasileiros e das exportações, se utilizando de uma grande diversidade industrial e empresarial para suprir essa necessidade.

A possibilidade de internacionalização para os países africanos, dos setores supracitados, tem como fator de importância para o Brasil, o fortalecimento das corporações, aumento das exportações e oferecer maior resistência econômica. Para os países da África, há a possibilidade de receber maior aporte de investimento externo, capacitação profissional aos trabalhadores e aumento na escala produtiva.

Mas além dos ganhos econômicos desfrutados dessa política de desenvolvimento, o Brasil soma ganhos políticos com a sua intenção de aproximação para o continente africano. Entre esses ganhos, encontram-se a criação da cúpula América do Sul – África (ASA), depois de uma visita presidencial a Nigéria, em 2005, e da primeira participação brasileira, como convidado, na União Africana, em 2009.

Portanto, é de grande relevância analisarmos como a política externa brasileira trabalha em acordo com a política doméstica de desenvolvimento do governo Lula. Desenvolvimento, no sentido não estritamente econômico, mas social, político e cultural, buscando desta forma, agregar resultados na política internacional. Faz-se necessário entender e analisar como a política externa está ligada ao plano produtivo do governo, em relação a internacionalização de empresas ao continente africano. Estes baseados no apoio governamental para a expansão das firmas brasileiras, através dos acordos de cooperação – intermediadas pelo Itamaraty – nas áreas entendidas como estratégicas para o país.


BIBLIOGRAFIA CITADA

  • ALEM, Ana C. CAVALCANTI, Carlos Eduardo. “O BNDES e o Apoio à Internacionalização das Empresas Brasileiras: Algumas Reflexões”. Revista do BNDES. Vol. 12, n. 24, pp. 43-76, 2005
  • AMBROZIO, Antonio Marcos. “Entendendo o investimento brasileiro direto no exterior”. Visão do Desenvolvimento: BNDES. N. 52, pp. 1-7, 2008
  • CERVO, Amado Luiz. (2007), Inserção Internacional: formação dos conceitos brasileiros. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 297 p.
  • EXTERIOR, Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. Política de Desenvolvimento Produtivo. Disponível em: [http://www.desenvolvimento.gov.br/pdp/index.php/sitio/conteudo/conteudo/2/0/165]. Acesso em: 20/02/2010.
  • EXTERIORES, Ministério das Relações. Atos Bilaterais Vigentes. Disponível em: [http://www2.mre.gov.br/dai/bilaterais.htm]. Acesso em: 22/02/2010.
  • SARAIVA, José Flávio Sombra. “A África na ordem internacional do século XXI”. Revista Brasileira de Política Internacional. Vol. 51, n. 01, pp. 2008
  • VIGEVANI, Tullo; CEPALUNI, Gabriel. “A Política Externa de Lula da Silva: a estratégia de autonomia pela diversificação”. Contexto Internacional. Vol. 29, n. 02, pp. 273-335, 2007.

Vico Dênis de Melo é Mestrando em Ciência Política pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE e bacharel em Relações Internacionais pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB ( vico_denis@hotmail.com).


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